Alegoria da Ilha

Um conto sobre a Inflação

ECONOMIA

Pessoas comerciando em uma ilha
Pessoas comerciando em uma ilha

Vimos no post O fim do Parão-ouro sobre as consequências da mudança de modelo econômico que o mundo passou em 1971 e como a emissão de papel moeda pode causar um grande e terrível efeito na economia. O objetivo desse post é apresentar uma alegoria que demonstre os passos mais detalhados sobre esse efeito inflacionário.

Alegoria da Ilha

Um conto sobre a inflação

A alegoria da Ilha

Suponha uma tribo que viva em uma ilha isolada do mundo. Essa tribo produz legumes, frutas e peixes, e realizam trocas desses produtos entre si - em um modelo conhecido como escambo. Esse modelo foi muito utilizado nas sociedades humanas primitivas e funcionava bem, era prático a seus habitantes, mas gerava problemas sobre como calcular o valor de cada produto. Um quilo de peixe equivale a quantos quilos de alface? Ou a quantos quilos de tomates? Se a produção de tomates cair, essa relação mudará? Aqui a Lei da Oferta e Demanda se torna bem evidente.

Para simplificar o cálculo desses valores, os habitantes dessa tribo começam a realizar as trocas de produtos por meios de pequenas moedas esculpidas conforme a casca de uma árvore exótica encontrada na ilha. Eles esculpem 1000 moedas e distribuem de uma forma justa a todos os habitantes. O pescador decide vender 1 quilo de seus peixes por 2 moedas, mas chegará ao final do dia e achará que foi pouco, pois não conseguiu comprar a quantidade de frutas e vegetais desejados por sua família. Ele também conseguiu vender seus peixes rapidamente, esgotando o produto e ficando sem realizar novas vendas, visto que mais moradores o procuraram durante o dia e não puderam ser atendidos.

No segundo dia, o vendedor de peixes cobrará 4 moedas por sua mercadoria, e pode ocorrer de alguns moradores acharem caro, visto que o frango estará sendo vendido por 2 moedas. Pode ser que nem todos os seus peixse sejam vendidos naquele dia, ocorrendo uma sobra.

No terceiro dia, o pescador cobra 3 moedas pelo quilo: os moradores acham um preço justo e compram toda sua mercadoria, ao passo que o mercador fica feliz com o valor ganho, sendo suficiente para comprar o que necessita. Ele gostaria que os peixes fossem mais caros e acha que as pessoas poderiam pagar a mais, porém, aceita o que estão dispostos a pagar. Esse é um importante fato sobre a economia, que indica que os produtos não são precificados de acordo com o trabalho que necessita para serem produzidos ou pelo valor que o vendedor acha que deve ser: o preço de um produto é determinado por quão dispostas as pessoas estão para pagá-lo.

Com o passar dos dias e após múltiplas trocas de diversos produtos, os peixes estabilizam em um preço de 3 moedas de madeira e os tomates a 2 moedas, por exemplo.

Agora imagine que ao invés de 1000 moedas esculpidas, sejam distribuídas 2000, em mesmos percentuais para cada habitante. O mesmo volume de peixes, frutas e vegetais é produzido, a única mudança que tivemos foi uma base monetária com o dobro do tamanho. A tendência agora é que os peixes sejam negociados por 6 moedas e os tomates por 4. Isso ocorre porque existirá o dobro de moedas em circulação para a mesma riqueza, e quando o mercador sugerir um aumento do preço de 2 para 4, os consumidores terão esses valores "sobrando" em suas reservas, aceitando a negociação. Com o tempo, os preços estabilizarão na mesma relação de 2 para 1 das moedas que foram criadas.

Um ponto que precisamos entender é que a riqueza dessa tribo não está nas moedas de madeira esculpidas, e sim, nos peixes, frutas e vegetais. Dessa forma, percebe-se a riqueza na produção que aquela ilha gera - ou extendendo-se para um país.

A partir desse exemplo, percebemos que o aumento da moeda circulante causou um aumento de preços, mas não gerou um aumento de riqueza.

Novas moedas em circulação

No exemplo da ilha, imagine agora que as 2000 moedas fossem esculpidas, porém, com uma relação de distribuição diferente. As primeiras 1000 moedas são distribuídas conforme as mesmas regras dos exemplos anteriores, porém, as últimas 1000 moedas são distribuídas para os familiares do lenhador que teve a ideia de utilizar-se das cascas de árvores. O pescador por exemplo ganhou 100 moedas a mais, e poderá comprar um maior volume de tomates e frutas. Meio injusto, não é? Acontece que com o passar do tempo, as 2000 moedas estarão em circulação, e causarão o mesmo aumento de preços observados, porém, quem se beneficiou foi o pescador e os familiares do lenhador, que ganharam mais moedas no início, gastando-as com os produtos ainda em preço baixo.

Esse fenômeno se chama Efeito Cantillon, e foi descoberto pelo economista francês Richard Cantillon no século XVIII. Ele indica que com a geração de mais dinheiro, os maiores beneficiários são as pessoas que primeiro recebem essas moedas, ou seja, grandes empresas e bancários mais próximos do Banco Central. Eles conseguem gastar o dinheiro antes que o aumento de preços seja percebido, visto ser a primeira circulação da moeda. Com base no aumento da circulação desse novo dinheiro, o comércio e salários tendem-se a ajustar para os valores mais elevados, porém, por um momento, os primeiros a gastar ficaram mais ricos.

O Efeito Cantillon nos mostra que com a criação de novo dinheiro, os beneficiários são as pessoas que primeiro receberam; enquanto as últimas sofrem com a Inflação, aumento de preços e uma "redistribuição da pobreza".

Com esse efeito econômico percebe-se o quão grave e impactante é a geração de novas moedas de forma desigual para a população. Isso ocorre diariamente em todos os países, dado o fim do padrão-ouro. Com o passar dos anos a inflação causada por tal efeito vai aumentando drasticamente e o valor guardado na poupança passa a valer cada vez menos.

Por isso, devemos nos atentar às nossas finanças, economizando, investindo e diversificando, garantindo que o nosso dinheiro esteja protegido da inflação - ou pelo menos seus danos sejam minimizados. Trataremos disso em um próximo post.